sábado, 10 de fevereiro de 2018

A Forma do Conto de Fadas




Quando se vai ver um filme da mulher, da princesa, que se apaixona pelo monstro, temos o eterno arquétipo de A Bela e a Fera. Temos vários exemplos disso, incluindo o recente da Disney em que a Hermione virou a Bela. Temos várias corruptelas, conto com tom moderno, como aquele ruinzino que o cara é amaldiçoado com uns filamentos de metal na cara, aquela outra versão francesa e por aí afora vai. Aí você pensa que A Forma da Água é mais uma versão da Bela e a Fera. 

E fica por isso. 

E muda de ideia por lembrar que é um filme de Guillermo del Toro. 


Em seu amor pelos monstros e em sua delicadeza em falar de amor, como se pode ver nos Hellboy que dirigiu, o filme sai daquela curva simples do bonitinho, fica longe de um filme da Disney, flui com leveza sem ser piegas em seu detalhamento e não tem vergonha de ser adulto. Sim um conto de fadas de adultos, uma história de amor sem muitas ingenuidades além da de crer que monstros existem e podemos ama-los. 


Os elementos do arquétipo estão lá: temos a princesa Elisa Esposito, magnificamente interpretada pela inglesa Sally Hawkins que, pasmem, estava em Episódio I. Por princesa entenda uma mulher comum que logo bebê teve ferimentos na garganta que a tornaram muda e que ganha a vida como faxineira em um laboratório do governo dos EUA nos anos 60, em plena Guerra Fria, em meio à luta pelos direitos civis e os mísseis em Cuba, como é sutilmente demonstrado pelas TVs ligadas e os noticiários. A apresentação dela à partir de sua rotina diária é uma bela descrição da monocórdia mesmice e do cultivo de hábitos. Claro que serve para mostrar também que, mesmo na monotonia, é uma pessoa viva.


No lugar de xícaras, candelabros e bules temos uma amiga protetora e falante, Zelda, interpretada por Octavia Spencer, de Estrelas Além do Tempo. A personagem é divertida pelos seus diálogos sobre a vida com o marido Brewster (Martin Roach), que me lembram muitas amigas casadas com maridos assim... tipo o Brewster. Ela cuida de Elisa, segura a fila de bater o ponto, a aconselha e, se Elisa é muda, Zelda fala. E fala. E fala por Elisa também, traduzindo para os outros muito do que Elisa diz. As vezes até suavizando o que Elisa quer dizer. 


Temos também o vizinho desenhista/pintor/artista Giles, em uma delicada interpretação de Richard Jenkins, de quem Elisa cuida para que não esqueça de comer. A homossexualidade dele é discreta como era de se esperar pela época retratada pelo filme, inclusive com as aparentes dores que a vida dentro do armário trazem para um homem culto e sensível que precisava enfrentar preconceitos e ignorância. E mesmo assim, de uma vida com medo, ele acha forças para amparar Elisa tanto quanto ela o ampara. 


O vilão do filme é o General Zod. Não, não o general em si, mas o Agente Strickland, um Michael Shannon suburbano, menos focado que o Zod, mas tão vilanesco quanto. Me surpreende como Shannon interpreta bem o estereótipo do spooky estadunidense, o homem obcecado por sucesso, que tem uma família aparentemente por ser o que os superiores esperam de um homem confiável e, ainda sim, um homem obtuso, sem sutilezas, que trata a criatura somente como um animal a ser dissecado, um meio para um fim que ninguém sabe exatamente qual, somente que é uma vantagem tê-la antes dos soviéticos. Seu personagem incorpora todo o machismo esperado de um homem americano médio da época (e de hoje, também, pois existem muitos assim), tentando ser educado ao falar com outras pessoas somente para tentar se mostrar superior a elas e sempre usando da  imposição de sua patente para conseguir o que quer, sem se preocupar muito se humilha alguém no processo. E mais ainda a atração que ele desenvolve por Elisa, não é pela mulher em si, mas pelo fetiche de possuir uma mulher muda. Strickland se torna abjeto por tudo o que seus preconceitos e mesquinharias representam, não por ser somente um personagem, mas por sabermos que são, talvez, as características mais reais dentre todos os personagens, nos lembrando que temos monstros reais ao nosso redor. 


O Prof. Hoffstetler (que não é Leonard...) interpretado por Michael Stuhlbarg é o tipico homem da ciência, o idealista que acredita que se pode realmente aprender algo com a criatura. É um homem que viu na atividade política um meio de abraçar mais ciência, ir além, mas acaba enredado pela ignorância e brutalidade que o jogo politico impões àqueles que nele estão. Acho que ele seria o bule que ajuda a Bela. Mas sua atuação vai além disso, está mais para um contraponto às ações de Strickland, uma pedra em seu caminho, mesmo que não tenha patente para contrariá-lo. 



E, claro, temos nosso monstro. O monstro, criatura, espécimen, ser, homem anfíbio, é claramente inspirado no clássico Monstro da Lagoa Negra, é uma das obras de arte que Doug Jones sempre nos apresenta. O Sr Saru de Star Trek Discovery nos dá um personagem que não usa palavras. Sim, semana que vem tem resenha de Discovery já que domingo é season finale na CBS e então vamos falar muito de Star Trek. Mas voltando ao monstro... Houve o cuidado em criar a criatura com o maior número possível de efeitos práticos para aumentar a realidade, o que significa um traje de látex que demorou semanas para ter o molde esculpido e depois até mesmo tinta bioluminescente para o detalhamento, além, é claro, de mais de duas horas e meia de preparação para o ator começar a filmar

O homem anfíbio é algo que foi encontrado e trazido da América do Sul para ser estudado, como um trunfo de Strickland e um meio de galgar degraus na hierarquia apresentando resultados para o General Hoyt. 



Não é uma fera que precisa de redenção, ser curada de um feitiço, mas apenas de ajuda real em sua luta pela vida. Afinal, tudo que se pode fazer com uma criatura desse tipo em laboratório será feito até acharem que já tiraram informação da criatura viva para depois saber te mais algo para se saber dela depois de morta. Lembrando que hoje há um questionamento moral do comportamento da ciência diante de novas espécies, vale lembrar que até pouco tempo era praxe fatiar o que se encontrava de novo para saber como é diferente do que já se conhece.






A relação entre Elisa e a criatura acontece de forma simples, como a raposa ensinando o pequeno príncipe sobre laços, mas usando ovos e música. A conquista da confiança da criatura e depois o aprendizado da linguagem de sinais, até um momento em que se percebe que Elisa e a criatura quase se comunicam com os olhos é fascinante.

Esse encontro inusitado do amor, metáfora da nossa busca eterna da pessoa que nos tornará completos ou, pelo menos da pessoa que venha a se somar a nós, é elegante e com cores e luzes que deixam muito claras as mudanças de ambiente. É uma coisa que del Toro faz muito bem: usa a luz como um dos contadores de história. Os tons verdes para o laboratório marcam bem o ponto da história, assim como ótimo uso das sombras. Preste atenção nisso quando vir o filme, tanto quanto na maravilhosa trilha sonora desenvolvida por Alexander Desplat. Temos até Carmem Miranda fazendo uma ponta.

Em suma, é um filme a ser visto, para se deixar seduzir pelos ovos cozidos oferecidos


A Forma da Água (The Shape of Water, EUA, 2017)
Direção de Guillermo del Toro


Elenco:
Sally Hawkins como Elisa Esposito
Michael Shannon como Colonel Richard Strickland
Richard Jenkins como Giles
Doug Jones como Amphibian Man/The Asset
Michael Stuhlbarg como Dr. Robert Hoffstetler/Dimitri Antonovich Mosenkov
Octavia Spencer como Zelda Delilah Fuller
Nick Searcy como General Frank Hoyt
David Hewlett como Fleming
Lauren Lee Smith como Elaine Strickland
Morgan Kelly como the Pie Guy



quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

Altered Carbon - Cyberpunk Altered


Sou fã do cyberpunk há muitos anos. Acho que é uma das vertentes de sci-fi com mais possibilidades criativas pois os autores acabam por buscar criar tecnologia à partir do que podemos considerar real, do que podemos aceitar como futuro tecnológico da nossa espécie. E mais ainda: a capacidade de mostrar que nossa espécie pode se degradar cada vez mais em seu processo evolutivo. E sim, claro, vejo isso com certo realismo, já que da Idade Média para cá a tecnologia apenas aumentou nossa capacidade de proporcionar desgraças a nós mesmo. Já escrevi sobre isso antes. Pode ler aqui

Então chega Altered Carbon, produção do Netflix com todos os 10 episódios da primeira temporada disponíveis. A série é baseada nos livros do mesmo nome escritos por Richard Morgan (o primeiro já foi lançado no Brasil com o título Carbono Alterado, pela editora Bertrand Brasil) e talvez seja interessante sabermos algumas coisas antes de ver a série. 

O principal mote é a criação dos stacks, o carbono alterado, onde a raça humana aprendeu a transferir a consciência, a alma, o backup do conhecimento humano para outro corpo. Dessa forma, a morte se torna apenas algo a ser passado, corpos se tornar sleeves, traduzidas como capas em vez de mangas. Provavelmente (ainda não li o livro) o termos "manga" do original deve ser por se poder trocar de corpo como se troca de camisa. A morte, a chamada morte real, é quando o cartucho é destruído, impossibilitando a transferência da consciência para outro corp... digo, outra capa. 



No melhor jeitão Blade Runner, a raça humana se espalhou por outros planetas, alguns fora do sistema solar, e a Terra ainda é o berço da humanidade mas com um jeito de decadência bem explicito. A série não toca no assunto, mas no século 25, onde transcorre a ação, só deve ter vida vegetal de verdade nos planetas fora da Terra ou por quem puder pagar por um jardim. Assim, como, se você for rico o suficiente, pode ter clones e não precisar usar as capas que se encontrarem disponíveis. Isso talvez seja o mais chocante: como todo ser humano que nasce tem um stack, em caso de morte da capa se pode transferir a consciência para outra capa disponível mas, se você não tem dinheiro, significa voltar na capa que o governo ou seu seguro te der, que pode ser de outro sexo, raça e com os vícios do corpo original. Sim, tem corpos sintéticos também, se você puder pagar por eles. Nessa parte não consigo evitar pensar o O Sexto Dia, com o Schwarza... 


As Inteligencias Artificiais tem status de seres com direitos, ao mesmo tempo que são vista com preconceito pela sociedade (mas acho que eles devem aceitar dróides em seus bares) e gerenciam estabelecimentos comerciais. Ao mesmo tempo, a religiosidade é supérflua, exceto em alguns grupos como demonstrado pelos neo-católicos, fiéis que creem que que a transferência da consciência é um pecado, que Deus nos criou para uma única vida. Tudo indica que isso é forte na Terra, mas não nos outros planetas. Esses neo-católicos são como as Testemunhas de Jeová do futuro, pois seus membros, mesmo sendo gravados em stack, não podem ser reencapados, assim como não se pode receber transfusões de sangue.


Mas nesse mundo, que acaba por ser muito bem retratado na série em suas dicotomias, os ricos vivem nas alturas, longe da sujeira da superfície onde vivem os pobres. Aí as fontes de Blade Runner jorram, com edificações que ficam acima das nuvens, onde o sol brilha sempre, não tem tempo ruim, alcançados por carros voadores, claro, enquanto a superfície é suja, molhada, entulhada e com as mesmas barraquinhas de comida chinesa que fazer vc pensar que vai ver um Harrison Ford no fundo ou um Edward James Olmos de relance. A opulência os ricos em contraste com a miséria dos pobres me faz lembrar da mini-série da reformulação do Gavião Negro da DC pelo Timothy Truman. (escrevi sobre isso aqui, o primeiro texto do blog, lá em 2012), até mesmo com a brutalidade das forças polícias, enquanto unidades especiais agem como as tropas de choque tanagarianas enquanto os locais entendem melhor o funcionamento daquele ambiente onde o sol não bate. 






Mas os ricos levam a reflexão sobre o que a imortalidade pode fazer com o ser humano. Enquanto o vampiro é a alegoria da imortalidade e seu preço, o custo de viver os séculos e ver entes queridos morrer ou condená-los à mesma danação, ou se tornar predador da antiga espécie, no caso não há um custo ou escolha moral, exceto de fazer clones e usá-los, inclusive transferindo a consciência via satélite para corpos espalhados pelos mundo, eliminando viagens, uma nova versão do teletransporte. Mas há um questionamento de até onde você permanece humano, o que viver tanto pode fazer com a moral, com a ética e demais coisas que toram a sociedade coesa. Nesse ponto, as atrocidades que se pode fazer para evitar o tédio, a frustração da mesmice e tantas coisas que podem atingir os ricos, a ideia plantada em parte da população pobre que eles podem ser um tipo de espécie de deuses é perigosíssima quando alguns deles passam a acreditar nisso. 


Lembro claramente desse questionamento em uma história do Thor em que alguém questionava o fato de os deuses serem imortais lhes tirava a real dimensão do valor do combate por poderem morrer. É quando Thor lembra os interlocutores que os deuses também morrem.

Eu ainda levanto uma questão quanto ao backup da consciência: sendo backup uma cópia, quando o corpo morre e se restaura o backup, não se fala do original. Para onde foi a alma, o original que habitava aquele corpo? A série toca nesse assunto muito levemente nas discussões do núcle neo-católico, mas estão lá, de leve. 


A história da série, como um bom cyberpunk, busca raízes no noir, e apresenta um ex-CTAC, ex-revolucionário, ex-mercenário Takashi Kovacs, um colono nascido em Harlan, um mundo colonizados por japoneses e europeus do leste, que é reencapado 250 anos depois de sua mote e captura para fazer um trabalho de detetive para um matusalém (Laurens Bancroft, vivido por James Purefoy, nosso sempre lembrado Marcos Antônio da série Roma) que foi assassinado e quer saber o que houve, pois a memória de suas últimas 48 horas foi  perdida. Inicialmente, Tak é vivido por Will Yun Lee, que você lembra de ser o arqueiro ninja no sofrível Wolverine: Imortal, mas prefiro o papel dele em 007 - Outro Dia Para Morrer. Quando reencapado é interpretado por Joel Kinnaman, o Robocop do Padilha.




A investigação em altos e baixos e às vezes parece que as tramas paralelas parecem ser mais importantes do que a solução do crime, conforme vão surgindo personagens e suas tramas de apresentação precisam ser exibidas de alguma forma. Assim, parece que é mais importante apresentar o mundo e os personagens do que resolver o crime. Isso, em outras séries, poderia ser um demérito, mas em um universo tão rico em detalhes é algo que nos prende em entender como funciona esse mundo. 

A Tenente Kristin Ortega vivida por Martha HIgareda é a detetive que atormenta nosso herói querendo mandar o terrorista de volta para o gelo, mas não pelos motivos que parecem.  


Explicar os demais personagens é contar a trama, dizer o que eles fazem. 

Mas os elementos do filme noir estão lá: a femme fatale, o policial senior, os corruptos, os criminosos, os assistentes e ajudantes do detetive, os traidores. 

E palmas para Edgar Alan Poe. 

Por que?

Veja a série. Se eu contar mais, vou spoilar. 

Ah, sim... antes que eu me esqueça: não é para crianças. Tem violência, tem algum sexo e é bem brutal em suas apresentações da corrupção moral do futuro. Que é mais ou menos como a corrupção moral do presente. Igual a corrupção moral do passado.

Eu fui de ver como ficou a dublagem porque eu vi legendado da primeira vez... e como sempre a legenda foi feita para o cabeça-oca médio, então omite muita coisa... as a tenente xingando em espanhol é ótimo... "Donde estãn mi ropas carajo??!!" Eu acho isso muito legal o uso de diversos idiomas, meio que como se todo mundo vive bastante aprende um monte de idiomas... os sotaques se perdem na dublagem, mas respeitaram quando falam outros idiomas. Então a dublagem ficou muito boa. 

Altered Carbon (EUA, 2018)
Série criada por Laeta Kalogridis
Produção Netflix
1 temporada, 10 episódios. 

sábado, 13 de maio de 2017

Alien: Convenant - Alienado



O xenomorfo de Alien - O 8º Passageiro, com aquele desing criado pelo H.G. Giger (5 February 1940 – 12 May 2014) já entrou para a nossa cultura popular, para a cultura nerd de forma irreversível. Já imaginamos nossos inimigos sendo hospedeiros dos aliens só pra imaginar o peito deles abrindo.
James Cameron dirigiu o Aliens: O Resgate em 86 e sacramentou os bichinhos de língua com boca dentuça, fora nos apresentar aos Colonial Marines. Claro que os filmes ajudaram a Sigourney Weaver a ficar conhecido no mundo todo. 

Meu!!! Eu tenho a caixa do Alien na estante! Eu tenho um xonomorfo na outra estante!

Aí um belo dia temos a notícia que o Ridley Scott e seu coração bate, seus olhos brilham e você pensa no terror que pode ser, já que Aline 3 e 4 foram... esquisitos. O 3 tentava voltar às raízes mas é meio estranho. O 4 é troncho demais. Os Alien Versus Predador são medianos e alguns consideram ruins. Eu até gosto, com algumas reservas. Mas lembramos de tudo isso e temos esperança de algo bom quando o pai da criança volta pra casa. 

Aí veio Prometheus. 

Não é um filme ruim. Tem uma Charlize Theron meio megera que me deixa meio abobado. O Idris Elba tá bem. Aquela menina daquele filme europeu também. E temos o MIchael Fassbender. O roteiro é meio assim. Poderia ser mais instigante. POderia. Mas não é. Mas não é um filme ruim. Só tem algumas coisas mal explicadas. A cena da navinha chegando ao planeta enorme é maravilhosa. Gosto dessas cenas de espaço. Numa escala 10, vai um 6,5. 

Ai esperamos o que vem depois. E vem Covenant. 



Os trailers te deixam com vontade de ver. O vídeo de ligação entre os filmes divulgado duas semana antes do lançamento te deixam com vontade de ver. Aí você vê e fica pensando em como desver. 

Vamos falar do filme sem dar spoiler, vamos falar pelo que podemos perceber do trailer pra não estragar a surpresa. Apesar de que, se você vai sempre ao cinema, vê filmes em casa, baixa pra ver, sei lá, dá seu jeito, não vai ter surpresa nenhuma no filme. É cantado o momento de cada vítima e de cada ataque das criaturas. Não tem suspense ou surpresas. Então, se aparecer algum spoiler, não é spoiler, você não precisa de mim para saber como a coisa vai acabar. 

Covenant é o nome da nave de colonização que está indo para planeta que pode ser terraformado para receber vida humana, carregando suas mais de 2000 almas. Uma evento cósmico obriga Walter, o sintético da nave, a acordar a tripulação para a emergência. 



Sabe, tripulação de emergência? Aquele pessoa treinado e preparado, astronautas prontos para lidar com o impossível para sobreviver no espaço? Igual ao Matt Damon no Perdido em Marte, que também é dirigido pelo Ridley Scott? Mecânicos, técnicos, militares, gente experiente e pronta para lidar com situações de risco no espaço. Esse pessoal que é acordado, esse povo bom. E quando consertam a nave, um chamado, pasmem que inédito, um chamado de rádio é captado e o esquadrão anti-sinistro vai investigar um planeta ainda melhor que o que eles estão indo colonizar, prontinho para ser colonizado. Como não viram antes, vai saber. 

Aí começam os absurdos. 

Você vai para um planeta possivelmente hostil, desconhecido, desce para dar uma espiada, e você não está na Interprise, para que seus scanners de longa distância digam se é seguro ou não andar por esse planeta classe M; você desce e já dá um abela cafungada nesse ar alienígena. Ninguém tem medo de respirar um esporo, um pólen, um patógeno qualquer. Meu, Vida, aquele filme que ninguém quis ver do micróbio que vira geléca e quer destruir tudo que não é ele, já ensinou que você não desce num planeta desses sem uma roupa de proteção até colher amostras e testar tudo. A NASA já ensinou isso. Só se você tem filtros biológicos no teleporte. Mas esse pessoal vai passear no jardim da morte de boné e jaqueta com a mochila nas costas como quem vai fazer uma trilha. 




Como o trailer mostra, o povo pega o peste no ar e aí o povo entra em pânico. PÂNICO. Sabe, aquele pessoal preparado e treinado para situações de emergência e sinistros? Então, a mina entra em pânico junto com a outra mina e aí começa a ir tudo pro vinagre, porque ninguém obedece protocolo de proteção contra patógenos. 

Surge o David, não é surpresa, a bola tava cantada. E você já saca que ele não é legal. Meu... desculpa, mas eu vou falar: o David meio que vira o HAL 9000, o computador com vontade de ser perfeito e não tá afim de concorrência com a humanidade. 

Walter... vá para Dagobah

Walter... I'm your father.

Daí pra diante vemos capitão de nave que arrisca todos os seus passageiros, gente que anda sozinha pra vc saber que vai morrer, e etc, etc, etc. Nem vou dizer que é clichê, pq é ruim, mesmo. Até a maior reviravolta não é surpresa, porque é tão cantado e esperado que não significa nada. 


A atuações são nada impressionantes e não nos ligamos a personagem nenhum. Não lembramos o nome de ninguém, nem da mocinha do filme. Quase nem vemos que o James Franco tava no filme. A gente lembra do Walter e do David porque o Fassbender leva o filme nas costas, mas não salva o filme. Nem declamando Ozymandias de Shelley. 

Meu nome é Ozymandias, rei dos reis:
Contemplem minhas obras, ó poderosos, e desesperai-vos!

Pior é que o filme, de certa forma, presta um desserviço à cronologia e à mitologia do Alien, pois muda coisas do universo expandido )se é que podemos chamar assim) em quadrinhos e livros, impossibilita todos os Alien VS Predador e te deixa imaginando com que isso vai ser ligado ao Oitavo Passageiro no próximo filme, pois vai ter pelo menos mais um. Quem escreveu o roteiro estava alienado. OU queria deixar todo mundo alienado sobre tudo que já conhecemos do Alien. Ou o Scott queria nos surpreender. Mas fez como aquele vô que quer te surpreender no seu aniversário e te dá um par de meias. 

Nota 4. E porque eu estou feliz hoje. 




Alien: Covenant (EUA, 2017)
Direção: Ridley Scott
Elenco: Michael Fassbender, Katherine Waterston, Billy Crudup, Danny McBrite, 
Duração: 123 minutos

sábado, 11 de março de 2017

Gongando o Kong


E estreou essa semana o novo filme do King Kong, Kong - Ilha da Caveira. 

E o que achamos do filme? Podia ser pior. Mas é legal até certo ponto. 

Vamos falar das partes boas e vou falando do que me incomoda em relação à elas e depois falo do que é realmente ruim. 

O filme se passa em 1973, e pega exatamente os dias da retirada dos Estados Unidos do Vietnã (uma das locações do filme, inclusive) e isso claramente é justificado para a curiosa descoberta da Ilha da Caveira pelos primeiros mapeamentos com fotos de satélites. Claro que uma ilha envolta em uma tempestade que nunca acaba provavelmente já teria sido avistada de alguma forma, mas serve também para criar um tipo de mística quanto ao lugar, como se fosse um Triângulo das Bermudas do Oceano Pacífico. Em alguns momentos você quase tem umas recordações de Jonny Quest, um certo saudosismo das produções originais dessa época (pelo menos pra gente da minha geração, talvez). Isso é uma das partes boas do filme, pois não é uma época distante que precisa de mais cuidado com o visual e também não é uma época tão moderna em que os absurdos não são possíveis. 

Bill Landa (John Goodman)



Então, na premissa da história, Bill Randa (John Goodman) consegue permissão para acompanhar uma missão LandSat. O Landsat foi uma projeto da NASA que, à partir da segunda metade da década de 60, usou mapas para rastrear e observar recursos naturais terrestres. Meu, perfeito como desculpa para explorar uma ilha inexplorada, mesmo que isso lembre um pouco a premissa do King Kong de 1976 em que o pessoal buscava petróleo. Já se percebe que a organização governamental liderada Landa não está preocupada somente com recursos naturais e ele pede uma escolta militar. 

Cel. Preston Packard (Samuel L. Jackson)
Aí entra o nosso bom e velho Samuel L. Jackson como Coronel Preston Packard, um homem em retirada de uma guerra que ele não sente perdida, mas abandonada, um reflexo bem comum dos militares estadunidenses da época, que tinham a sensação de que a guerra poderia ter sido ganha se os tivessem deixado luta-la. Um homem inconformado com o desperdício de vidas de seus comandados. .
Mason Weaver (Brie Larson) e James Conrad (Tom Hiddleston)
Para completar a equipe, temos uma fotografa pacifista Mason Weaverm que atuou no Vietnã, vivida por Brie Larson, ganhadora do Oscar. A única mulher no elenco chega falando grosso, mais se equiparando aos brucutus com quem tem que lidar do que como uma personagem feminina. Dá a impressão que podia ser um ator que não ia fazer diferença, já que o foco do filme não é um macaco gigante apaixonado por uma loira gata. Justamente por isso é meio que desperdício uma ganhadora do Oscar estar em um filme pipoca. Não que quem ganhe Oscar não possa fazer papéis ruins ou genéricos, como é o caso. Afinal, todo mundo precisa ganhar a vida e por comida na mesa, não é mesmo?

Surpresa é o Loki, o nosso bom Tom Hiddleston, no papel do ex-SAS James Conrad, que o Sr. Landa vai procurar em um bar do sudoeste asiático com todos os clichês que já vimos em Braddock, De Volta para o Inferno, O Franco Atirador e tantos outros filmes que mostram alguém indo procurar alguém no submundo daquela parte do mundo. Ele age como o mercenário durão e já faz seu cartaz na entrevista de emprego sobre o porquê que ser tão valioso para os "cientistas". O ator é bom, mas talvez o personagem não fosse para ele. Não convence como o SAS. Tem uma velha piada russa que diz: "-Foram os americanos... - Como vc sabe? - Se fossem os SAS britânicos, só saberíamos que estiveram aqui de manhã; se fossem os israelenses, nunca saberíamos, pois os mortos não sabem de nada."


Então meio que o roteiro não me convence que ele seja um SAS especialista em sobrevivência. É como se faltasse alguma coisa para nos convencer disso, de que ele é o super trooper que um SAS deve ser. Principalmente nos pontos de conflito com o Cel. Packard, ficando só para bem próximo do final ver como isso se resolve. Por isso a solução e separar os grupos e tornar os dois núcleos separados para um contar como é a ilha e o outro quem é Kong. 


Dessa vez, os nativos são asiáticos em uma ilha do Pacífico, na verdade, vietnamitas mudos e a história do Kong é contada com a solução de acharem um náufrago que vive na ilha desde a Segunda Guerra, o Ten, Hank Marlow, interpretado pro John C. Reilly. Essa é a parte em que alguém conta a história e os mistérios da ilha para o público se ambientar na história em vez de adivinhar tudo ou o sábio ocidental deduzir tudo. É meio chato. Mas funciona melhor que achar nativos que falassem inglês. 

Hank Marlow (John C. Reilly) 
A fauna da ilha é apresentada aos poucos, depois do encontro dos helicópteros com o jovem Kong. Sim, o jovem Kong, já que o filme deixa claro que ele ainda não atingiu seu tamanho adulto, por isso ele ainda não é o "King". Se algumas partes de megafauna resultante de gigantismo insular é plausível dentro da premissa do filme, outras são meio deslocadas, como encontrar cervos. Eu esperava grande roedores anfíbios, como capivaras e antas, ou algo mais estranho. Pelo menos os grandes monstros da ilha satisfazem o desejo por ver monstros criando problemas para os estranhos. Achei a cena da aranha gigante muito interessante. 



Bom, claro, como mostra o trailer, que os exploradores encontram o Kong depois de lançar cargas sísmicas para explorar a formação geológica da ilha. Sim, isso era assim mesmo: alguém colocava sismógrafos especiais em algum lugar e alguém detona ou lançava cargas explosivas para que a reverberação do impacto pudesse ser detectada e ter um mapeamento. Hoje se usam radares e sonares e outros métodos menos destrutivos. Mas isso era o gancho para irritar Kong e mais uma razão para o filme se ambientar nos anos 70. E quando o macacão aparece pela primeira vez é legal. Você se convence de que não é exatamente um gorila, mas uma espécia de símio  



Esse primeiro encontro define duas grandes inspirações do filme: Apocalipse Now de Coppola e Moby Dick. O filme é uma homenagem à Apocalipse Now e O Coração das Trevas, de Joseph Conrad, o livro que inspirou o filme. O livro trata de um retrato do sistema colonial francês na África e é uma narrativa em primeira pessoa muito assombrosa. Eu amo o livro e o ritmo dele e como conta a história de alguém indo buscar o líder de uma unidade de exploração para devolvê-lo à civilização, mais ou menos como em Apocalipse Now. Vários personagens tem seus nomes tirados do livro, como James Conrad (Joseph, o autor), Hank Marlow (Charlie, o marinheiro), Chapman (O farol na entrada do Tâmisa entre 1851 e 1957). Faltou chamar alguém de Kurtz.


A revoada de helicópteros de Kong chega na ilha jogando suas bombas e tocando um bom rock em alto-falantes em um Huey. Acho que usar a Cavalgada das Valquírias não combinava com o clima do filme. Mas, é música e bombardeio e para os soldados, vindos do Vietnã e querendo voltar para o Mundo [1] é uma maneira de tornar tudo divertido. 


Claro que dá tudo errado e como um personagem diz "foi uma situação tática sem precedente o por isso não tínhamos como saber o que fazer". E nesse momento o Cel Packard se torna um Capitão Ahab buscando vingança contra a força da natureza que matou seus homens, como o Ahab da literatura quem vingança contra a baleia branca que arrancou sua perna. Sendo Samuel L. Jackson, isso se torna intenso e você assume que ele está errado por ir contra uma força da natureza. E isso se torna o foco dos conflitos quando os grupos se reúnem, pois Conrad não é como um Ismael que narra a história ou mesmo um Sr Starbuck. É algo entre isso e vai além, mas em vez de um Qui Queg temos a fotografa que poderia ser um fotografo que poderia nem estar lá.  

O conflito sobre certo ou errado ir contra a natureza
Uma vez em terra a exploração da ilha, lenta e deslumbrante parece, mesmo, uma ode a Fitzcarraldo e insignificância humana em sua luta com uma natureza inclemente, tanto quanto a arrogância do homem em tentar, com a sombra de, se conseguir, acabará por destruir a si mesmo, na máxima do arquiteto da própria destruição. Tanto nas artes conceituais essa citação a Fitzcarraldo poderia ter sido realmente escrachada no filme. 

Concept Art - Puxar um barco pela floresta... Fitzcarraldo total. 







Isso se comprova quando Kong não mata quando não precisa, enquanto o ser humano o caça por vingança. 

Agora falar do que realmente me incomodou, do que não gostei, daquilo que achei me chamaram de idiota.

1- O navio de carga que serve como porta-helicópteros leva claramente um CH-53 Sea Stallion no heliponto da popa e um CH-47 Chinook no heliponto da proa e quatro UH-1 Huey no convés central. 

Mas de onde, em nome de todos os deuses do ar e do voo, de onde eles tiraram e decolaram doze Hueys? Gente... 12!!! e só tinha 4 no conves!!!  E dois com o nariz pintado com a cruz vermelha de resgate em um hangar no castelo de popa que depois viram 3!!!


2 - São uma unidade de Cavaleria Aérea, com pessoal de helicóptero, que são pilotos, co-pilotos e artilheiros. As aeronaves não estão carregando pessoal de infantaria para uma missão, então falamos só das tripulações e de suas aeronaves. E morrem vários.

Onde foi que conseguiram um M2 Ma Duce .50 BMG com o tripé?
Gente, isso é pesado demais para ser levada por um soldado, fora a munição. Quando transportada pela infantaria, essa arma é desmontada e distribuída em uma guarnição de 5 soldados. 5!!! E pra montar isso num reparo tripé M3 não leva 15 segundos. 


3 - Lança-chamas foram usados no Vietnã, mas estavam na lista de armas especiais. Não tinha razão nenhuma para ter um lança-chamas numa missão de exploração, Não engoli essa também. 



Fora isso, o núcleo dos militares funciona. Parecem mesmo os caras que querem voltar pra casa depois da guerra enquanto outros viram guerra demais e outros viram guerra de menos. De fato, o único personagem que evolui no filme é o Cel Packard. Os outros, ficam daquele jeito. 

Para quem viu todos os filmes de King Kong, o pano de fundo mudo um pouco e isso é bom, mas no decorrer do filme se reconhecem as cenas, os truques e se percebe que não é um filme realmente novo, só os detalhes mudaram. Kong não vai para a cidade, não é capturado e fica apaixonado pela mocinha. Mas as lutas com a fauna da ilha, os monstros vilões e tudo mais, com tribo nativa e muro gigante estão lá, sem novidade. Ter um Ahab e não um empresário oportunista muda, dá outro ritmo, mas ainda assim tudo soa como se já tivesse sido visto em outro filme, mesmo que o conjunto funcione. 

Resumindo, Kong - Ilha da Caveira, é um ótimo filme para se divertir. Tem problemas, mas acho que sói pra gente chata como eu. Não deve agradar a todos, mas é algo a ser visto.

Inclusive porque é o primeiro de um universo cimatográfico já denominado de "Monsterverse" com o próximo sendo "Godzilla - King of Monsters" com precisão de lançamento para 2019 e "Godzilla vs Kong" em 2020. Justamente por isso, além de montar um universo compartilhado como a Marvel, também adotaram a cena de pós-crédito para falar do que vem por ai. Ao ler os créditos antes da cena, terá pista do que vai aparecer na cena. Então não saia correndo do cinema se quiser saber o que vem por aí. 

Kong - Ilha da Caveira (Kong - Skull Island, EUA, 2017)
Diração: Jordan Vogt-Roberts
Com: Tom Hiddleston, Brie Larson, Samuel L. Jackson, John Goodman John C. Reilly
Duração: 120m

Kong - Skull Island também gerou uma linha de brinquedos e action figures produzidas pela Lanard usando moldes do The CORPS. Não sabemos ainda se isso setá lançado no Brasil, mas já está disponível nos EUA e Europa.




[1] Quando no Vietnã, os soldados contavam os dias para voltar para o Mundo, ou seja para casa. quando faltava pouco tempo para voltar ao Mundo, eles estavam "Curtos" e já era o período que muitos começavam a reclamar de qualquer missão que pudesse mata-los e impedir sua volta para o Mundo.